JOVEM LGBT FALA SOBRE TER SIDO EXPULSO DE CASA APÓS RECEBER MENSAGEM DO PAI

Marcos Paulo Moreira tem 25 anos é natural de Goiânia e atualmente vive em Curitiba. Além de ator, Marcos também tem um canal no YouTube onde fala sobre sexualidade, política e espiritualidade. Recentemente, o jovem LGBT postou nas redes sociais parte de sua história, compartilhando uma troca de mensagens recente que teve com seu pai. O texto que pode ser lido logo abaixo, no entanto, faz parte de um contexto muito maior, por isso o Alguém Avisa foi atrás do Marcos para compreender o que levou ele a este momento.

O jovem conta que sua relação com o pai não era das melhores desde muito antes de ele sair do armário. Seu pai vem de uma região rural, e segundo ele “esperava um filho que fosse um peãozinho pra ajudar ele com as coisas de homem, mas eu era a pequena miss sunshine”.

Desde pequeno Marcos, que hoje é ator, já fazia teatro e dança, na escola. Segundo ele, seus pais acreditavam que era só um passatempo e que a popularidade fazia dele um pré-adolescente “hetero pegador”, e que por isso eles nunca desconfiaram da sua sexualidade. Mas na verdade, Marcos conta que “já tinha uma vida homossexual ativa com primos e colegas. Mas a palavra “gay” nunca havia sido dito na minha casa católica. Meus pais eram ministros da eucaristia na igreja, os carinhas de branco que entregam a hóstia”.

Com 15 anos Marcos se apaixonou pela primeira vez por um menino. Ele conta que não apenas saiu do armário, mas que “meteu o pé na porta”. Costuma dizer que não teve processo de aceitação, pois para ele era algo muito simples e natural. Ele só não contava com a reação dos seus pais.

A mãe de Marcos descobriu através de terceiros, e veio questioná-lo. Ele simplesmente confirmou. Então ela contou pro pai dele. E foi aí que de fato começou a história. O pai de Marcos se sentou pra conversar com ele, como nunca havia feito antes, mas segundo Marcos, “o autocontrole dele não durou cinco minutos. Naquela noite ele me espancou, me estrangulou, me arremessou uma cadeira, os vizinhos tiveram que intervir e eu tive que subir no telhado pra fugir dele. Então alguém chamou a polícia. Quando a polícia chegou eu pensei que estava a salvo, mas quando meu pai explicou pra eles o motivo pelo qual estava me batendo, os policiais mudaram completamente a abordagem. Eles fecharam as portas de casa e passaram a me “educar” juntamente com meu pai. Disseram que eu tinha que virar homem e não podia dar aquela vergonha pra minha família e ainda ameaçaram me fazer dormir na delegacia. Quando me disseram isso eu estava sangrando e coberto de hematomas.Eu saí de casa no dia seguinte e nunca mais voltei a morar com meus pais.

Este tipo de situação com jovens LGBT’s infelizmente é muito recorrente e não acontece apenas no interior. Por isso achamos não apenas importante, mas necessário dividir histórias como a do Marcos. Há uma tendência a invisibilizar estas histórias. Em muitos casos, algumas pessoas chegam a dar razão para os pais. Por sorte, o Marcos decidiu sair de casa e hoje tem uma vida bastante feliz, mas esta nem sempre é a realidade de outros jovens.

Por isso, a importância de conhecermos as histórias antes de dizermos algo. Na última semana, o pai de Marcos enviou pelo Whatsapp uma mensagem onde dizia o seguinte:


Em resposta a mensagem do pai, Marcos escreveu o texto abaixo:

“Bom… pois para mim eu não tenho nem nunca tive problema nenhum. Você procura alguém para colocar a “culpa” do “problema” por que você acredita que há algo de errado comigo, mas não há nem nunca houve. O problema só existe na sua cabeça. Sempre fui feliz e nunca tive um pingo de arrependimento nem vergonha de mim mesmo. Se a minha mãe na gravidez não queria me ter pra mim não é problema. É muito natural que uma mulher na idade que ela tinha tivesse medo de ter filhos ou simplesmente não quisesse ser mãe por que queria viver a própria vida. E se ela decidisse por não engravidar era direito dela, inclusive eu sou a favor do aborto. Ter ou não ter filho é uma decisão que cabe só à mulher e a mais ninguém. O que importa é que no fim ela decidiu me ter, mesmo que tenha sido por pressão, e durante toda a vida eu nunca me senti rejeitado por ela. Só amor.

Com você não posso dizer o mesmo… De você eu sinto a rejeição desde pequeno. Você sempre foi frustrado comigo porque eu nunca fui o filho que você esperava, nunca me interessei pelas coisas que você gosta: futebol, fazenda e afins. Você coloca a “culpa” na criação da minha mãe por que você acha que uma criança é uma folha em branco sem personalidade que os pais vão ensinando tudo o que ele é, mas não é assim que funciona. Uma criança já é uma pessoa. Ela já nasce com uma personalidade. Ela já nasce sendo o que é. Minha mãe não me ensinou nada errado nem me incentivou a nada, ela simplesmente respeitou a pessoa que eu era. O interesse por livros, teatro, poesia, e por gostar de homem não foi minha mãe que me ensinou. São coisas que já nasceram comigo, que ela viu e simplesmente respeitou e até admirou.

E eu não abandonei ninguém. Nós já falamos disso várias vezes e me parece que você perde a memória quando tem seus surtos de raiva, por que depois não se lembra mais das coisas que fez ou que falou. Então eu vou repetir pela última vez as suas palavras: “Se você for continuar nessa vida pode ir embora da minha casa.”. Você berrou isso na minha cara enquanto estava me enforcando no chão. E eu fui embora pela sua ordem e pra proteger a minha própria vida por que o que todos nós vimos naquela época é que você tem um instinto assassino. Então não apareça anos depois dizendo que eu “abandonei” vocês, isso é muito cínico. Eu nunca abandonei minha mãe nem minha irmã, sempre mantive o convívio, inclusive elas frequentavam minha casa quando eu estava casado e elas saiam com a gente de vez em quando pra ir em cinema e afins. A única pessoa de quem eu me afastei foi de você por que a nossa relação não faz o menor sentido. Você me vê como o resultado de um problema e eu te vejo como um pai que não sabe ser pai.

Então pare de procurar um culpado pra tirar a culpa de cima de você. Ninguém tem culpa por eu ser como sou, até por que eu me considero uma pessoa maravilhosa, o que a grande maioria das pessoas tem por mim (menos você) é orgulho. Todo mundo que conviveu comigo na infância e adolescência me procura pra dizer que sentem orgulho da pessoa que eu me tornei. Você uma vez por ano aparece pra perguntar com o que eu tô trabalhando. Pelo amor de Deus, tem 10 anos que eu trabalho com teatro, você não entendeu ainda que é essa minha profissão? Ou você acha que é mentira e eu tô ganhando dinheiro de outras maneiras? Só você não vê o profissional que eu me tornei na minha área e fica preocupado se eu tô passando necessidade. Só que enquanto isso sou eu que estou ajudando minha mãe e a Ana a fazer compras e até pagar contas de casa depois que elas saíram de casa. Não sou eu quem está passando necessidade.

Então assim, se for pra me procurar pra vir com essas falsas desculpas, tentando difamar minha mãe ou fazer essas perguntas sem lógica que só ofendem, nem precisa.”

Após a mensagem enviada, o que poderia ser um momento para reflexão acabou se tornando o motivo real para a mensagem inicial do pai de Marcos. O jovem conta que depois que saiu de casa houveram várias tentativas de reconciliação, todas elas por iniciativa de Marcos. O jovem sempre considerou que é mais fácil ele entender a realidade do pai do que o contrário. Mas segundo Marcos, “em todas as vezes ele (o pai) tornou a fazer algo que rompesse tudo novamente, até mesmo outros episódios de violência. Um tempo atrás ele usou a nossa cadela “Belinha” pra chantagear a família emocionalmente, tirando ela de casa e a levando pro sítio, onde ela foi atacada por outros cachorros e morreu. Isso culminou no tão esperado divórcio dos meus pais. Agora ele está tentando descredibilizar minha mãe para ter vantagens na separação de bens e atravancar o processo o quanto pode. Espalhou na comunidade a mentira de que minha mãe seja lésbica, sugerindo que eu “herdei” dela a homossexualidade. Essa nossa última discussão começou um ano atrás quando ele veio me pedir pra fazer um exame de DNA”.

Após ouvir esta história, que como mencionamos anteriormente, é mais recorrente do que imaginamos, nos perguntamos, até quando os filhos serão vítimas das violências físicas e verbais de pais que não conseguem aceitar algo tão simples como o amor. Torcemos que o Marcos continue sendo essa pessoa cheia de coragem, mas que também possa encontrar tranquilidade para ele, sua mãe e irmã.

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