GUSTAVO BERNARDES FALA SOBRE O CENÁRIO LGBT NO BRASIL DE 2020

Adeus ano velho: a vida real LGBT num Brasil Fascista, um texto de Gustavo Bernardes – militante LGBT e de Direitos Humanos. Os últimos dados de LGBTfobia no Brasil revelam que um LGBT morre a cada 23 horas no Brasil. Tivemos gay assassinado em São Paulo, travesti assassinada no Rio Grande do Sul e trans agredida a pauladas em Roraima, esses são alguns exemplos. Mas isso não é novidade para a população LGBT, a novidade é a naturalização da violência homofóbica e a inação e o descaso do Governo Federal e dos governos estaduais.

Muitas vezes o Governo Federal foi indutor de políticas públicas positivas para a população LGBT. Criava políticas que eram seguidas por governos estaduais e municipais, por exemplo, as conferências LGBT e as coordenações LGBT e os Conselhos LGBT. No ano de 2019 aconteceu o inverso, o desmantelamento das políticas para a população LGBT foram seguidas por muitos executivos estaduais e municipais. O ano de 2019 trouxe um alento para a população LGBT quando o STF equiparou a LGBTfobia ao crime de racismo mas o avanço parou por aí. A situação dos LGBT é crítica no atual momento do Brasil, quando assistimos o crescimento da extrema-direita e de grupos neofascistas. Hoje, mais do que nunca, precisamos de uma articulação maior dos movimentos sociais LGBT e de políticas públicas para lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais. O medo da população LGBT quando da eleição de Bolsonaro em 2018 se mostrou justificado em 2019.

Nesse ano o Ministério das Mulheres, da Família e dos Direitos Humanos boicotou sistematicamente as políticas já existentes para a população LGBT e não criou nenhuma nova política para promover os direitos da população LGBT. A Diretoria LGBT do Ministério é uma farsa, faz reuniões que vão do nada para lugar nenhum, serve apenas para atender vaidades pessoais desconsiderando totalmente os direitos da população LGBT. Trata-se de uma direção fantoche que apenas legitima o desmonte das políticas LGBT. Em junho o governo Bolsonaro publicou o Decreto 9.883/19 que desarticulou o Conselho Nacional LGBT, reduzindo os representantes da sociedade civil de 15 membros para 3 membros. O Conselho poderia ser o espaço privilegiado onde o movimento social LGBT poderia ajudar a dar efetividade à criminalização da LGBTfobia conquistada junto ao Supremo Tribunal Federal. Contudo, neste momento, o Conselho é simplesmente inviabilizado.

No mês de maio o governo Bolsonaro já havia acabado com o departamento de aids do Ministério da Saúde. O fim do departamento invisibiliza a epidemia de aids que atinge principalmente gays e jovens.
Em agosto de 2019, o Ministro da Cidadania, Osmar Terra, suspendeu, a pedido do presidente Bolsonaro, o edital de seleção para produções audiovisuais de temática LGBT. O objetivo, evidente, foi censurar as produções artísticas e invisibilizar mais uma vez a população LGBT. Esses são apenas alguns exemplos.

O movimento social, por sua vez, parece engessado e dividido. As redes que englobam as ongs parecem pouco dispostas a construir alternativas e parecem perdidas e, algumas vezes, alienadas. O controle social parece ter sumido do horizonte das redes LGBT que se dividem entre os bajuladores e os paralisados pela fúria do ataque da extrema-direita brasileira.
Mas qual seria o norte para 2020?

1. Inicialmente é preciso reconstruir um espaço de diálogo entre as diversas redes e ongs LGBT. Talvez seja preciso reeditar o Encontro Brasileiro LGBT (antigo EBGLT) que já foi esse espaço desde a década de 1980 até meados dos anos 2000;
2. Os partidos políticos com compromisso com os Direitos Humanos e com espaços de articulação LGBT precisam abrir um canal de diálogo entre si e é preciso construir uma pauta para as eleições municipais de 2020;
3. O movimento LGBT precisa definir que políticas públicas são necessárias para efetivar a criminalização da LGBTfobia. Já temos o exemplo do movimento de mulheres com a Lei Maria da Penha e a lei do feminicídio;
4. O movimento também precisa definir a estratégia no Congresso Nacional e de relação com um governo de extrema-direita. Não estamos mais lidando com um governo simpático a pauta. Temos que atentar para não legitimar um governo que é inimigo dos LGBT e que trata com descaso os assassinatos de gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais;
5. Em nível internacional, precisamos denunciar sistematicamente o governo Bolsonaro perante os organismos internacionais. Estamos lidando com um governo que não apenas tolera a morte de LGBT como também deseja essa morte;
6. Precisamos retomar o Conselho Nacional LGBT para que ele volte a ser o espaço consultivo e deliberativo do Governo Federal, para tanto, é necessário apoiar o Projeto de Decreto Legislativo 487/2019 do deputado David Miranda (PSOL) que susta o Decreto 9.883/2019;
7. Outro aspecto que precisa ser reforçado junto ao Congresso Nacional é no que tange ao Projeto de Lei 7582/2014 da deputada Maria do Rosário (PT) e que trata dos crimes de ódio. Com a decisão recente do STF sobre a criminalização da homofobia o projeto ganhou novo fôlego e foi aprovado na Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.

Por fim, cabe lembrar que a luta antifascista não se faz sozinho é preciso união e articulação com outros movimentos que são perseguidos pelo ódio bolsonarista. 2019 foi um ano péssimo para os brasileiros e, em especial, para as populações mais vulneráveis, contudo, se mantivermos a inércia teremos um 2020 ainda pior. Lutemos!

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