PROFESSORA TRANSEXUAL TROCA INDENIZAÇÃO DE R$ 20 MIL PELA CHANCE DE DAR AULA PARA SEUS AGRESSORES

A professora de matemática transexual Natalha Claudinei Silva Nascimento deu, na última sexta-feira, uma aula inusitada: dentro de uma sala do Fórum de Justiça de Brasília, falou não para alunos adolescentes, mas sim para 40 funcionários de uma pastelaria de onde ela era xingada diariamente. Na aula, em vez dos números que ensinou por mais de dez anos como professora de ensinos médio e fundamental, Natalha lecionou sobre gênero, aspectos biológicos e comportamentais dos transgêneros, direitos, violência contra os desiguais e a importância de denunciar atos discriminatórios.

“Foi a ignorância que me fez sofrer por todos esses anos e quero acabar com ela com a eduçação”, diz a maranhense de 35 anos.

O motivo do encontro foi um processo judicial movido no final do ano passado por Natalha contra a tradicional pastelaria Viçosa, localizada na rodoviária de Brasília, um dos locais de maior movimento na capital federal. A professora alega ter sofrido agressões e xingamentos diários por parte de um grupo de funcionários do estabelecimento.

“Eu não tinha outra alternativa. Para pegar o ônibus para casa, eu só podia passar em frente à pastelaria e tinha que aturar esses xingamentos”, lembra. A gota d’água ocorreu em 26 de abril, quando ela decidiu conversar com os funcionários, pedindo para que parassem. Um deles se aproximou, a derrubou no chão e a agrediu violentamente.

Vida com medo

“Fiquei sem reação. Humilhada, só me perguntava por que aquilo acontecera comigo. Estudei, trabalhei, tentei ser o melhor que pude, mas o fato de ser uma mulher transexual me fez construir toda a minha vida em cima do medo, desde criança”, desabafa. Ao acionar a Justiça, Natalha pediu R$ 20 mil reais de indenização por danos morais. Durante a conciliação judicial, porém, a professora decidiu abrir mão da quantia, pedindo em troca a chance de dar uma aula de questões de gênero à equipe da pastelaria Viçosa.

“Não tem dinheiro no mundo que valha a minha dignidade e respeito. Moro na favela mais perigosa do Distrito Federal e quero transitar livremente sem ter medo de morrer ou ser assassinada por ser quem sou”, diz. “Para mim, o único jeito de viver isso é pela educação, que pode transformar uma sociedade violenta, preconceituosa e corrupta.”

Tive que esconder a minha transgeneridade até onde pude. Caso contrário, poderia morrer’, relembra Natalha, sobre sua infância no interior maranhense

A pastelaria demitiu o funcionário responsável pela agressão física. Patrícia Rosa Calmon, a proprietária, reconhece que falhou por não ter orientado seus funcionários quanto ao respeito às pessoas transgêneras, “até porque sempre entendi que todos são iguais. Mas fico contente que Natalha pôde nos ensinar algo”, diz.

‘Melhor indenização possível’

Natalha reconhece que, enquanto esperava pelos seus novos alunos na aula especial, teve medo de cara fechada e mais rejeição. “Só que eles chegaram abrindo sorriso e me dando boa tarde. Achei estranho, esperava bate-boca mas encontrei atenção. Até brinquei com eles que, quem aprendesse a lição de que ‘respeito não tem preço’ já estaria aprovado. Eles riram bastante”, conta Natalha. Mas dessa vez, não era um riso de zombaria, e sim de generosidade e empatia sobre o que uma professora trans tinha a dizer. “Foi a melhor indenização que eu poderia ganhar na minha vida”, avalia.

Confira a matéria completa em: BBC

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