CHRISTIAN GONZATTI FALA SOBRE PESQUISA QUEER E SUAS RELAÇÕES COM A CULTURA POP

Doutorando em Ciências da Comunicação, Mestre em Ciências da Comunicação na linha de pesquisa de Linguagens e Práticas e graduado em Comunicação Social com habilitação em Publicidade e Propaganda pela UNISINOS, Christian Gonzatti atua em projetos de pesquisa relacionados aos ciberacontecimentos e ao estudo de coletivos midiáticos que trabalham com questões de ativismo. Tem interesse nas áreas da cultura pop, semiótica, sites de redes sociais, jornalismo, publicidade e propaganda, redes digitais e estudos de gênero e sexualidade. Recentemente, ele defendeu sua dissertação de mestrado, visando entender, através dos sentidos acionados pelo Papel Pop, as relações entre o jornalismo, a cultura pop e os estudos queer. Propondo, assim, uma perspectiva jornalística específica para entender essas dinâmicas, o jornalismo pop: voltado à cobertura da cultura pop, pautando acontecimentos engendrados por uma lógica intensamente midiática e comercial. Sinalizando a maneira como o jornalismo pop do Papel Pop configura-se como uma territorialidade semiótica singular na cobertura da cultura pop, que rompe com pressupostos do masculino que atravessam o jornalismo hegemônico e que vai além da feminilidade que pode ser associada ao jornalismo cultural, sendo, portanto, queer.

Perguntamos ao pesquisador, o que o incentivou a abordar a questão LGBTQ em sua pesquisa. Christian comentou, que acredita que, sim, seu trabalho perpasse a questão LGBTQ com potência – e destacou o “Q” como um marcador que traz toda a carga reflexiva do queer para o movimento. Destacou que ele está abordando um problema das diferenças que são transformadas em desigualdades, tendo como principal foco o gênero. Declarando, que “penso que não devemos mais buscar respostas em blocos excludentes, por isso é uma dissertação que, com suas limitações, está engendrada aos feminismos, ao movimento LGBTQ, queer e a alguns problemas étnico-raciais. Essa percepção foi um ponto mobilizador para buscar os estudos que aciono ao longo do texto, mas como os saberes são localizados em determinadas subjetividades, o que demonstra muito bem Donna Haraway, existem aspectos da minha vivência impulsionadores da pesquisa: sou gay e um fã de várias produções da cultura pop”.

Para o autor, outra questão importante na escolha do tema, foi o fato de que atualmente, vivemos em um cenário no qual em média 1 pessoa LGBT é morta por dia; em que 51 % das pessoas são contra a adoção de crianças por casais LGBTs (no Brasil, existem 4.400 crianças na fila para a adoção e mais de 60 mil casais LGBT’s autodeclarados)18; que torna precária as vidas de muitas pessoas transexuais; de violências simbólicas que fazem com que a taxa de suicídio entre LGBTs sejam maiores; em que o racismo e a violência contra mulheres cisgêneras também são brutalmente desencadeados. É por isso, que Christian defende que “esses dados são centrais na defesa dos estudos feministas, queer e de etnia e raça como temáticas que devem ganhar espaço na comunicação, dada a maneira como os processos do campo são responsáveis por construir simbolicamente realidades e desencadear violências ou possibilidades de subversão”.

Sobre as dificuldades encontradas na academia, o jovem revela que o preconceito não veio diretamente pelo fato de estudar as questões de gênero, sexualidade e/ou étnico-raciais. A grande parte das críticas veio de bancas e colegas da área, que entendem a Cultura POP como um estudo banal e desnecessário. Embora esse não seja o problema da dissertação, o pesquisador trouxe aqui, um questionamento que o afetou em muitos desses atravessamentos e está diretamente implicado no objetivo da pesquisa: estudar a cultura pop seria queer? Além desse questionamento, Christian apontou que durante as aulas do mestrado foram recorrentes os comentários que reforçam a ignorância da população sobre as questões de gênero. O autor chegou a afirmar, que “convivendo com, principalmente, jornalistas, é visível que falta na formação acadêmica disciplinas que abordem marcadores das diferenças”.

Sobre a conquista de espaços de debate sobre o assunto na academia, Christian destaca que certamente, a Universidade é um espaço de alteridade e resistência. “Os estudos queer, por exemplo, trazem reflexões que, diferentemente do que leituras fundamentalistas tentam impor, demonstram como podemos nos tornar plurais, abraçando as diferenças e não marginalizando as pessoas que estão fora da lógica heterossexual e/ou cisgênera – apontando, em concomitância, a artificialidade que foi imposta compulsoriamente sobre o ser homem e o ser mulher. A comunicação – como pressuponho que o meu trabalho demonstra – pode se valer dessas potências para transformar as realidades desiguais”, aponta. Ainda apontando outras questões sobre o assunto, o jovem diz que para ela, “a coletividade e as trocas de saberes são cruciais na construção de conhecimento. Durante os anos de pesquisa, pude conviver com pessoas transformadoras e que teceram percepções sobre a minha pesquisa e compartilharam os seus estudos, ajudando-me a olhar os processos por muitos ângulos. É importante destacar a maneira como o grupo de pesquisa do qual eu faço parte, o LIC, Laboratório de Investigação do Ciberacontecimento, do PPGCCOM, coordenado pelo Prof. Dr. Ronaldo Henn se configurou como um espaço de formação humana-acadêmica na minha trajetória”.

Frente aos recentes retrocessos políticos e legislativos perguntamos para o pesquisador, o que ele acha sobre a importância de buscarmos cada vez mais espaços de destaque. Para encerrar, Christian foi direto e trouxe Foucault para dar base a sua resposta: “onde há poder, há resistência”. E finalizou dizendo: “Precisamos transformar as transviadices, a putaria, o gozo fora da norma e a alteridade em potências para combater as opressões”.

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